quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

5 meses de Rio de Janeiro

Lembro-me com exatidão do dia em que resolvi morar no RJ, acordei cedo para ir ao interior fazer uma audiência que ocorrei com 4 horas de atraso e onde a contragosto acabei fazendo um acordo.

Lembro-me claramente da volta para casa, do turbilhão de pensamentos que povoavam minha mente, alguns bem próximos outros mais distantes, mas todos com um alto grau de abstração, sequer conseguia me lembrar do nome da minha cliente de logo cedo, provavelmente nunca retornaria a ver-la novamente.

Enquanto isso, precisava conciliar meus devaneios com um mínimo de atenção que a direção em uma BR exige, somada ao cansaço de mais de uma centena de noites mal dormidas, frutos de uma vida absolutamente irregular e desregrada, sem horários, sem rotinas e sem saúde.

Para onde diabos estou indo? Ficava me perguntando (era um questionamento retórico, claro, me dirigia para casa). Meu grande problema naquele momento era olhar no espelho e pensar: O que vou fazer agora? De que forma vou ocupar minha cabeça? Estudar era absolutamente inviável, com a cabeça tão distante imersa em problemas das mais variadas naturezas, alguns absolutamente inesperados, frutos de equívocos e situações que nunca pensei que um dia pudessem acontecer.

Meu dia parecia se arrastar apenas a espera de um único momento: A academia. Era a minha redenção, por algumas horas eu tinha um foco, uma rotina, meu corpo se dedicava unicamente a seguir uma seqüência de atos, por um curto espaço de tempo as coisas pareciam ter algum sentido.

Andava mais anti-social do que nunca, cultivei hábitos que antes ojerizava, ia sozinho para as ultimas sessões de cinema durante a semana, as vezes comprava umas cervejas e ficava em casa tomando sozinho mesmo sem fazer nada em especial.

Neste dia a noite estava estático diante do computador, nada atraia a minha atenção, mantia minha presença virtual em segredo para os meus amigos, na minha cabeça esperava que como no clipe de “Do the evolution” tentáculos saíssem da tela entrassem em meus ouvidos e narinas e me transformassem definitivamente em um zumbi (talvez isso já houvesse acontecido e eu apenas não tinha percebido).

Inexplicavelmente naquele dia tornei visível a minha presença, nem sei com que intuito, não queria conversar com ninguém, minha ausência prolongada em meus círculos de amizades inevitavelmente provocaria o contato de meus amigos o que de fato aconteceu.

Mas, uma janela me chamou a atenção, parecia piscar mais forte e mais rápido que as outras. E ela tinha uma informação muito simples: “Diogo, a EMERJ abriu inscrições, porque você não faz a prova?” me disse Rivanda. No que automaticamente respondi: “Sim, vou me inscrever.” Na mesma hora fiz o cadastro virtual, no dia seguinte paguei a taxa e enviei a documentação necessária. Estava resoluto, iria para o Rio de Janeiro de qualquer jeito.

Só que as coisas não eram assim tão simples, morar no RJ antes de qualquer coisa significava sair da condição da auto-suficiência e regredir para a dependência total. Bem como voltar para um esquema de estudos ao qual nunca fui muito próximo, perder todas as mordomias e despreocupações que só a casa da mãe pode oferecer e trocar isso por todos os problemas que a solitária vida de um pequeno burguês solteiro pode proporcionar.

Acho que meu desnorteamento andava tão aparente que a noticia provocou basicamente duas reações:

1 – Pró RJ: “O Rio é a solução, lá você vai estabelecer uma rotina, você é um cara inteligente, só precisa de tempo e disciplina e em pouco tempo estará aprovado. Meu financiador (leia-se pai) seguiu essa linha, precisei de menos de uma hora de conversa.

2- Você só pode estar louco!!! (huahauahuah): "Do que diabos está fugindo? Acha que o RJ vai resolver seus problemas? Seus pensamentos irão junto com você, eles não vão se despedir no aeroporto" argumentou Raquel.

A segunda linha, exageros a parte, era a mais lógica, gerou muitos questionamentos, discussões, reflexões solitárias.

“Diogo, você esta financeiramente estável e em rota ascendente, tem dois empregos que pagam relativamente bem e exigem muito pouco, fora os extras que a advocacia proporciona, tem um carro bom, paga todas as suas contas, não deve explicações nem tem responsabilidades com ninguém, está acostumado a comer nos melhores restaurantes e freqüentar os melhores lugares, seus amigos estão todos ao seu alcance na hora em que você precisar e mesmo assim ainda quer abdicar disso tudo?” Questionou Saulinho.

Sim, quanto mais eu ganhava mais eu gastava, não conseguia juntar nada, não sentia que estava construindo algo e não via futuro naquilo no longo prazo. Estava cansado das festas, tive uma overdose de baladas, saia de casa como se fosse uma obrigação para fugir do ostracismo do lar. E ademais, meus bons amigos estão ao alcance de uma ligação e posso muito bem viver sem carro e não me incomodo em dar explicações sobre o que ando fazendo.

Mas havia algo mais profundo: “Diogo, seus momentos de sossego e alegria aqui são muito artificiais e efêmeros, como você vai lidar com isso tão longe de casa? Mal consegue dormir, vai acabar piorando.”

Sim, era um risco alto a correr, mas sabia quais eram as raízes do problema, e fui muito prático, nos dois meses que me restaram entre a decisão e a ida ao Rio tomei as mais drásticas e necessárias providencias. Fui muito objetivo com relação ao que precisava ser feito.

Minha primeira semana aqui foi caótica, mas em pouco tempo me adaptei, os motivos que me levaram a vir pra Ca estavam tão distantes que pareciam frutos da minha imaginação, às nove da noite já bocejava de sono, em pouco tempo estava feliz.

As vezes bate um saudosismo, volto agora das “férias” para o isolamento do meu apartamento, é a hora que mais estranho, mas não demoro a lembrar do motivo de estar aqui e caio na rotina de novo, mais satisfeito do que antes.

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